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Entrevista com a crítica literária Ronize Aline

Por Ana Cláudia Esquiávo

Talento é um dos pré-requisitos para ser escritor, mas isto não é suficiente para torná-lo profissional. Além de muita pesquisa, revisão e elaboração de uma boa história que prenda o leitor na primeira página é preciso ter técnica.
Crítica literária e coach de escritores, a autora Ronize Aline compartilha dicas de criação literária através do blog Conexão Autor com Ronize Aline, onde orienta pessoas que possuem uma boa ideia na cabeça e querem passá-la para o papel.

       Ronize ressalta que o ofício de autor deve ser encarado como profissão e precisa ser aperfeiçoado.

Literaleitura: Quando você começou a realizar consultoria literária e por quê?

Ronize: Há aproximadamente três anos e meio. Eu criei o blog Conexão Autor com Ronize Aline há quatro anos para divulgar o meu trabalho como escritora e compartilhar técnicas e dicas de criação literária. Fui crítica literária do jornal O Globo do Rio de Janeiro por mais de dez anos e há vários anos presto serviço de copidesque e leitura crítica para diversas editoras brasileiras, então os leitores começaram a me pedir para prestar os mesmos serviços também para eles. Com isso percebi que havia uma demanda por esse tipo de consultoria. Então, além da leitura crítica e do copidesque (que são aplicados sobre as obras já prontas), passei a oferecer também o serviço de coaching, já que muitos me procuram com uma ideia na cabeça mas não sabem como transformar essa ideia em história. O coaching faz o acompanhamento de todo o processo de escrita de um livro, desde a estruturação até o ponto final. 

L:    Você disse em uma entrevista que ser escritora era o seu plano principal. O jornalismo nos torna contadores de histórias do cotidiano, mas as áreas de Relações Internacionais e Engenharia de Sistemas podem ser encaixadas na literatura?  Por que?

Ronize: Esse é o meu percurso acadêmico, pois além de escritora e coach também sou jornalista e professora universitária. As Relações Internacionais e a Engenharia de Sistemas e Computação não têm a ver necessariamente com a literatura - apesar de a literatura tratar de todos os fenômenos humanos -, mas com os meus trabalhos como pesquisadora e professora.

L:   O que é preciso para se tornar um escritor profissional?

Ronize: Escrever. Pode parecer óbvio, mas muitos dizem ter o sonho de se tornarem escritor mas não arranjam tempo para escrever. Além de escrever, é preciso conhecer o ofício. Se você quer ser médico, vai fazer faculdade de medicina; se quer ser costureira, vai fazer curso de costura; se quer ser chef de cozinha, vai fazer cursos ou faculdade de gastronomia; se quer ser artista plástico, vai fazer faculdade de belas artes... Então, se quer ser escritor, tem que estudar também, aprender as técnicas próprias da profissão. Muitos acreditam que ou você nasce com talento ou não nasce. Se nasce com talento, não precisa fazer mais nada; se não nasce, então tem que desistir. Você nasce, sim, com aptidões que podem te ajudar na profissão escolhida. Por exemplo, minhas aptidões são voltadas para as palavras, não tenho a menor aptidão para números, então se escolhesse alguma profissão que me exigisse tal aptidão eu teria que vencer muito mais barreiras e talvez não conseguisse êxito profissional. Mas mesmo tendo aptidão para as palavras, fiz muito curso de criação literária, oficinas, workshops com autores, leio muito material específico, participo de eventos, palestras, tudo isso para estar sempre me aperfeiçoando, como em qualquer profissão. O essencial é que o escritor não pare nunca de se aperfeiçoar.

L: Como coach literária, qual o conselho você daria para um escritor vencer o bloqueio criativo.

Ronize: Há dois tipos de escritores: os chamados "planejadores" e os "instintivos". Eu sou do tipo planejadora. Estruturo todas as minhas histórias, crio perfil de personagens, detalho capítulo a capítulo antes de começar a escrever o texto. Isso me dá segurança, sei exatamente onde quero chegar e posso relaxar pensando apenas em "como" quero contar aquela história, e não "o que" quero contar, visto que isso já está definido. Isso também evita o bloqueio criativo, também conhecido como bloqueio de escritor: aquele momento em que você senta em frente ao computador e não sabe o que escrever. Os escritores instintivos não planejam nada: sentam-se e vão escrevendo à medida que as ideias vão surgindo. Nesse caso, é mais comum ocorrer o bloqueio criativo e vir a justificativa: "Hoje estou sem inspiração". Imagine se um jornalista, um fotógrafo, um arquiteto, um médico dissesse que não pode fazer o trabalho porque está sem inspiração. Se quer ser um escritor profissional, tem que encarar isso como qualquer outra profissão: 80% de transpiração e 20% de inspiração.

L:    Quais os conselhos que você daria para o escritor iniciante.

Ronize: Leia muita literatura, pode parecer clichê mas é lendo outros autores que nos habituamos à construção do texto e ao fluxo da narrativa ficcional. Aprenda a sua profissão, seja fazendo cursos, participando de eventos, conversando com outros escritores, buscando acompanhamento personalizado, o importante é buscar formas de especialização.

L:    Quais são os maiores erros dos escritores iniciantes?

Ronize: Achar que porque têm facilidade em escrever não precisam aprender nada, confiarem apenas na opinião da família e amigos, desconhecerem que existem profissionais especializados que podem ajudar nesse momento, terem medo de serem rejeitados por uma editora. Grandes autores já foram rejeitados diversas vezes antes de serem publicados. J. K. Rowling recebeu 12 "nãos" antes de uma editora decidir publicar seu primeiro livro, "Harry Potter e a pedra filosofal". Eu mesma, que não sou nenhuma J. K. Rowling, tive que esperar 9 anos para o meu primeiro livro, o infantil "O dono da Lua", ser publicado.

L:    Atualmente vivemos em um mercado editorial onde os autores estrangeiros são mais valorizados. Como o autor brasileiro poderia se destacar no meio literário?

Ronize: Hoje vivemos em uma época com muito mais opções do que há algum tempo. Se, por um lado, as editoras tradicionais têm se retraído por conta da crise financeira que assola o país, existem opções alternativas para lançar-se no mercado. Há a opção de fazer um crowdfunding para conseguir um financiamento coletivo e publicar um livro, fazer uma autopublicação ou mesmo publicar a história na Internet em sites especializados, como o Watpadd. A autora de Crepúsculo, Stephenie Meyer, foi descoberta assim.

L:    Existem técnicas para se escrever uma primeira página perfeita e que atraia o leitor?

Ronize: Sim. Uma das principais é que a história deve começar já na primeira página para prender o leitor. Isso significa que ela deve conter o seu personagem principal e o fato que desencadeia toda a ação da narrativa. É isso que motivará o leitor a continuar a leitura. Muitas histórias demoram a começar: têm flashback, têm descrição, têm digressão, mas história mesmo, nada! Lá no blog tem um post que aborda como evitar histórias que demoram a começar: http://www.ronizealine.com/2017/02/historia-que-demora-comecar-evite-esse-problema.html

L:    Você poderia explicar o recurso de narrativa “a Regra de Três”, citado em seu blog? Ele pode ser utilizado em qualquer gênero?

Ronize:Regra de Três é a técnica que apresenta sucessivamente três elementos relacionados a fim de alcançar um efeito literário. E o padrão de construção da Regra de Três é: similar, similar, diferente. Sendo que esse terceiro elemento, em muitas histórias, tende a ser o alívio cômico, o “diferente” que vai trazer um toque de humor, de leveza à circunstância. Esse recurso pode ser utilizado em qualquer gênero, sim. Vai desde os três desejos do gênio da lâmpada até os três patetas ou as famosas trilogias que fazem tanto sucesso.


L:  Você escreveu dois livros voltados para o público infantil ( Anete, nariz de chiclete e O dono da Lua) e depois publicou  O Ofício de Penélope ( livro de contos  sobre a arte de escrever).  Como foi a transição do publico infantil para o adulto.

Ronize: Na verdade, não houve transição. Desde sempre eu escrevo para adultos e crianças. Muitos dos contos de "O ofício de Penélope" foram escritos simultaneamente aos infantis, mas só lançados posteriormente. Além desses citados também participei de duas coletâneas adultas: "Manual literário para amar os homens (ou não)" e "Nouvelles de Brésil", essa última lançada na França, no idioma francês, com autores brasileiros.

L:  Qual autor (ou autores) mais lhe inspira? 

Ronize: Há uma tríade de autoras que me inspiram desde pequena, e continuam inspirando: Ana Maria Machado, Ruth Rocha e Lygia Bojunga. Elas costumam ser reconhecidas principalmente pela obra infantojuvenil, mas são uma referência para qualquer pessoa que queira trabalhar com texto literário.


Para conhecer o  trabalho da autora, crítica e coach literária acesse o site: http://www.ronizealine.com/


Ana Cláudia Esquiávo é jornalista e escritora

Um comentário:

  1. Ana, estou encantada com a sua entrevista e com o trabalho da Ronize! Adorei as dicas dela, parabéns a ambas! Bjs

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